PERIFERIA: A procura da poesia
A Literatura não passa bem e os dias de glória de um povo que valoriza seus poetas e escritores parecem estar cada vez mais distantes. Mas, há uma salvação, uma flor feia que rompe o asfalto nas áreas mais longínquas da cidade: a poesia da periferia, que inclusive começou dar as caras em alguns vestibulares.
Alheia aos ditames impostos por uma corja de pseudointelectuais, a poesia periférica brota nos bairros mais distantes do centro, em espaços alternativos onde jamais poderia esperar que a arte florescesse. E não é por acaso que as metáforas aqui sugerem esta natureza que eclode, pois se existe poesia na cidade de São Paulo, salvo exceções, ela é um fenômeno novo que está nas mãos, bocas e corações de jovens da periferia que trocaram as drogas e o crime pelos versos e rimas de transformação.
Um dos expoentes desse movimento é a figura guerreira do poeta colecionador de pedras, Sérgio Vaz, que encabeça religiosamente, e é assim que a poesia lhe parece, o Sarau da Cooperifa com seu “Manifesto da Antropofagia Periférica”. Todas às quartas-feiras, há mais de 10 anos, o bar do Zé do Batidão na Zona Sul (Jardim Guarujá) se transforma num espaço de poesia viva. E se a poesia existe na cidade de São Paulo de maneira visceral, contínua e producente é porque a Cooperifa está lá: transformando e mantendo a poesia viva.
Quando estive por lá, na ocasião do lançamento de meu livro “Ventania do Infinito”, quis presentear o poeta Vaz com um exemplar e ele replicou: “Mano, aqui a gente compra a poesia dos parceiros”; e comprou o meu. O mesmo aconteceu quando lançamos a “Revista Poema” na Cooperifa. E a corrente vai se fortalecendo em prol da sobrevivência da poesia.
As poesias de Vaz, Ferréz, Solano Trindade ecoam de tal modo a inverter a lógica do rótulo de poesia marginal e tornam-se hoje o centro da produção literária de São Paulo.
Óbvio que se engana aquele que vai buscar nestes poetas a distinção intelectual do chamado “cânone” que, de fato, funciona como fator excludente, pois mais do que métrica, ritmo e tradição, esta poesia é um grito de sobrevivência, uma bandeira do hoje que dá sentido à poesia e coloca o homem contemporâneo conectado com a máxima expressão do verbo e da realidade de seu tempo.
E a florescência poética não para por aí, as andorinhas seguem fazendo verão no “Sarau do Binho” no Campo Limpo, o “Elo da Corrente” em Pirituba, “O que dizem os Umbigos” no Itaim Paulista, o “Sarau do Candeeiro” no Sacolão das artes em Capão Redondo, o “Sobrenome Liberdade” no Grajaú, e muitos outros.
Se não viu, está feito o convite!