Já ouviu falar de hipercorreção linguística? - Hexag Medicina
02/03/2022 Português

Já ouviu falar de hipercorreção linguística?

Escrito por Hexag Educacional @hexagmedicina
Já ouviu falar de hipercorreção linguística?

Provavelmente você já testemunhou ou até já cometeu um ato de hipercorreção linguística sem perceber. Nem todo mundo conhece esse conceito que diz respeito a uma “correção” do português alheio que encontra erro onde não existe. 

Nessa tentativa de corrigir o que não precisa de correção, são cometidos alguns desvios gramaticais. Trata-se de um comportamento relativamente comum nos dias atuais, especialmente nas redes sociais. Vamos entender um pouco melhor?

O que é hipercorreção linguística? 

Resumidamente, a hipercorreção linguística se caracteriza pela tentativa de correção do que não precisa ser corrigido. Basicamente, é uma situação em que a tentativa de correção leva a um erro.

Existem duas causas dessa correção demasiada, sendo a primeira delas a variação linguística em que uma forma é considerada correta e outra errada. A outra causa é um desejo extremo de corrigir o português alheio. 

Exemplos de hipercorreção linguística na prática

Em nosso dia a dia somos testemunhas de casos recorrentes de hipercorreção linguística. A seguir iremos pontuar alguns desses exemplos para que o conceito possa ser entendido mais claramente. 

Chegou ou chegado

Muitas pessoas se sentem tentadas a corrigir as outras quando ouvem frases como “eu tinha chegado atrasado”. Se você está nesse grupo que deseja substituir “chegado” por “chego”, temos uma notícia chocante para dar. 

O particípio “chego” não existe pelo simples fato de que o verbo “chegar” não é um verbo abundante. “Chego” existe apenas no presente do indicativo, quando usado numa frase como “eu nunca chego atrasado” está correto. 

Colocação pronominal

A colocação pronominal é um dos temas que mais suscitam a hipercorreção linguística. Por exemplo, na escola é ensinado que nunca devemos iniciar uma oração com pronome oblíquo. No entanto, escrita e fala são duas modalidades diferentes da língua. Outro ponto relevante é que o português do Brasil é muito distinto do português de Portugal.

Um adendo relevante é o de que o português brasileiro sofre com a consideração de que apenas o português europeu está correto. Em Portugal, é comum o uso da ênclise, porém, nem sempre foi assim. A colocação dos pronomes átonos, no Brasil, em especial no colóquio normal, difere do português de Portugal. 

As pessoas tendem a decorar uma regra linguística sem entendê-la e acreditam que sempre o pronome virá depois do verbo. A partir disso, chegamos a algumas situações de hipercorreção linguística, isto é, a tentativa de corrigir o que não precisa ser corrigido. A seguir daremos um exemplo prático, leia a seguinte frase e tente achar algum erro:

“Quero que você me aqueça neste inverno.”

Essa frase está correta, não existe nenhum erro que possa ser apontado. O pronome oblíquo está exatamente onde deveria por ser atraído pelo pronome “você”.

Talvez você ainda não esteja convencido e esteja pensando: “pronomes que provocam próclise são os retos e esse é um pronome de tratamento, então algo não está certo”. A explicação nesse caso é muito simples, faz tempo que “você” deixou de ser um pronome de tratamento.

“Você” e a polêmica do pronome

A origem do pronome “você” é “vossa mercê”. O último era usado para se referir a alguém de uma classe social superior. Ao longo do tempo, houve a generalização desse pronome fazendo com que “você” fosse empregado na relação entre iguais em nosso país.

A democratização do uso do termo levou a um fenômeno linguístico chamado de “gramaticalização”, em que se dá a mudança de categoria gramatical. Após diversas aglutinações, o pronome “Vossa Mercê” (vossemecê, vosmecê…você) chegou a uma flor de pronome pessoal.

Sendo assim, é curioso observar que algumas gramáticas classificam “você” como um pronome de tratamento. Esse é o pronome pessoal de 2ª pessoa mais utilizado em nosso país. 

A questão gira em torno do fato de que “você” ainda é usado com formas verbais de 3ª pessoa. Isso faz com que ainda exista o entendimento de que é uma “forma de tratamento”. No âmbito semântico poderíamos classificar como um pronome de 2ª pessoa. Já no âmbito morfológico seria de 3ª pessoa. 

Gerúndio

Outro bom exemplo de hipercorreção linguística é o gerundismo. Os adeptos do uso de gerúndios acreditam que estão se expressando de uma forma elegante. Porém, essa construção linguística é totalmente equivocada no que diz respeito à estrutura da língua portuguesa. 

É importante dizer que o gerúndio é uma das formas nominais da língua portuguesa e usá-lo não está incorreto. A questão surge quando não se faz o uso correto do gerúndio. Normalmente, esse uso errôneo se dá pela insegurança do falante. Para saber falar o idioma, basta ter o português como sua língua materna. Então, não é correto dizer “eu não sei português” se você é um falante nativo. 

A partir desse pensamento, se cria uma ilusão de que tudo que está distante da fala habitual está correto. Contudo, nem sempre essa máxima é verdadeira. Devemos alertar ainda que a arrogância de quem se coloca no pedestal de grande conhecedor da língua gera diversas situações de hipercorreção linguística. Tenha o cuidado de não se colocar no lugar de corrigir o outro, pois você pode gerar inseguranças desnecessárias nos falantes. 

A hipercorreção linguística é um problema real do âmbito do preconceito linguístico.

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